A Alegria da Revolução
Capítulo 3: Momentos decisivos
Causa dos abismos sociais
Convulsões de pós-guerra
Efervescência de situações radicais
Autoorganização popular
FSM
Os situacionistas em maio de 1968
O obrerismo está obsoleto, mas a posição dos trabalhadores segue sendo central
Greves selvagens e ocupações
Greves de consumo
O que poderia ter sucedido em maio de 1968
Métodos de confusão e cooptação
O terrorismo reforça o estado
O momento decisivo
Internacionalismo
Capítulo 3: Momentos decisivos
“Quando o véu mítico é rasgado a trama é revelada, as relações de exploração e a violência que as mantêm são desnudadas, e a luta contra a alienação é definida com clareza, aí surge a ruptura, revelada repentinamente como uma luta corpo a corpo contra o rei nu, exposto em sua força bruta e debilidade. . . . momento sublime em que a complexidade do mundo se torna tangível, transparente, ao alcance de todos”.
—Raoul Vaneigem, “Banalités de base”
É difícil generalizar sobre as causas imediatas dos abismos sociais. Sempre houve uma grande quantidade de boas razões para a revolta, e antes ou depois surgiram instabilidades no sentido de que algo deve mudar. Mas por quê em um determinado momento e não em outro? As revoltas ocorrem com freqüência tanto em períodos de progresso, como debaixo das piores condições. Enquanto algumas são provocadas pelo mais completo desespero, outras o são por incidentes relativamente triviais. Os agravos aceitos pacientemente durante tanto tempo porque pareciam inevitáveis podem repentinamente parecer intoleráveis diante da possibilidade de sua sua eliminação. A mesquindade de alguma medida repressiva ou estupidez de qualquer patochada burocrática podem por em evidencia o absurdo do sistema mais claramente que uma acumulação constante de opressões.
O poder do sistema se baseia na crença das pessoas em sua impotência para opor-se a ele. Normalmente esta crença está bem fundada (os que transgridem as normas são castigados). Mas quando por uma razão ou outra bastante gente começa a ignorar as regras e o fazem com impunidade, a ilusão colapsa por completo. O que se pensava que era natural e inevitável se vê como arbitrário e absurdo. “Se ninguém obedece, ninguém manda.”
O problema é como alcançar esse ponto. Se só desobedecem uns poucos, estes podem ser facilmente isolados e reprimidos. De nada adianta fantasiar sobre as coisas maravilhosas que poderiam ocorrer “se todo mundo concordasse em fazer tal ou qual coisa.” Desgraçadamente os movimentos sociais não costumam funcionar desta maneira. Una pessoa com uma pistola de seis balas pode manter a distancia a centenas de pessoas desarmadas porque cada uma delas sabe que os primeiros seis a atacar serão assassinados.
Contudo, alguns podem estar furiosos a ponto de atacar sem fazer caso do risco; ou tentar convencer aos que estão no poder de que é mais prudente ceder pacificamente do que resistir despertando um ódio ainda maior contra si mesmos. Obviamente é preferível não depender de atos de desespero, mas buscar formas de luta que minimizem o risco até que o movimento se estenda o suficiente para que a repressão já não seja factível.
Os povos que vivem sob regimes particularmente repressivos começam naturalmente tirando proveito de qualquer foco de resistência já existente. Em 1978 as mesquitas iranianas eram o único lugar onde se podia criticar o regime do Sha. Então as enormes manifestações convocadas por Khomeini, a cada 40 dias, começaram a proporcionar segurança numérica. Khomeini chegou dessa forma a ser reconhecido como um símbolo geral de oposição, inclusive pelos que não o seguiam. Mas tolerar qualquer líder, mesmo enquanto mera figura representativa, é, na melhor das hipóteses, uma medida temporal que deveria ser abandonada tão prontamente quanto possível em favor de uma ação mais independente — como fizeram aqueles trabalhadores petroleiros iranianos que no outono de 1978 acreditaram ter força suficiente para ir à greve em dias diferentes aos convocados por Khomeini.
A Igreja Católica na Polônia estalinista jogou um papel igualmente ambíguo: o estado usou a Igreja para que lhe ajudasse a controlar o povo, mas o povo também usou a Igreja para que lhe ajudasse contra o estado.
Uma ortodoxia fanática é amiúde o primeiro passo em direção a uma auto-expressão mais radical. Pode ser que os extremistas islâmicos sejam altamente reacionários, mas o desenvolvimento do hábito de tomar os acontecimentos em suas próprias mãos complicaram o retorno à “ordem” e poderiam inclusive, se não se iludissem, a chegar a ser genuinamente radicais — como ocorreu com parte da igualmente fanática guarda vermelha durante a “revolução cultural” na China, quando o que foi originalmente uma mera treta de Mao para deslocar alguns de seus rivais burocráticos conduziu finalmente à insurgencia incontrolada de milhões de jovens que levaram a sério sua retórica antiburocrática.(1)
Se alguém proclamasse: “Eu sou o maior, a pessoa forte, mais nobre, mais inteligente e mais pacífica do mundo”, seria considerado insuportável, senão louco. Mas se diz exatamente as mesmas coisas sobre seu país é tido como um cidadão admiravelmente patriota. O patriotismo é extremadamente sedutor porque permite ao indivíduo mais miserável ligar-se a um vicário narcisismo coletivo. O afeto nostálgico natural da família e da terra natal é transformado em um culto estúpido ao estado. Os medos e ressentimentos do povo se projetam até ao estrangeiro enquanto suas aspirações frustradas de uma comunidade autêntica se projetam misticamente em sua própria nação, que é vista de algum modo como essencialmente maravilhosa apesar de todos seus defeitos. (“Sim, a América tem seus problemas; mas estamos lutando pela América real, por tudo o que a América representa realmente.”) Esta consciência mística de rebanho foi quase irresistível durante a guerra, sufocando finalmente toda tendência radical.
Não há dúvida que às vezes o patriotismo exerce uma função oposta às lutas radicais (p.e. Hungria 1956). A guerra às vezes trabalha contra as revoltas. Mas aqueles que suportam a maior parte das cargas militares, supostamente em nome da liberdade e da democracia, podem reclamar ao voltar para casa uma parte justa de sua contribuição. Participar da luta e adquirir o hábito de destruir obstáculos os torna menos inclinados a crer em um status quo imutável.
As manobras e desilusões produzidas pela I Guerra Mundial provocaram levantes por toda Europa. Não aconteceu a mesma coisa na II Guerra Mundial porque o radicalismo genuíno foi destruído pelo estalinismo, o fascismo e o reformismo; porque as justificativas dos vencedores para levar a cabo a guerra, carregadas de mentiras como sempre, vieram mais aceitação do que de costume (os inimigos vencidos são obviamente os maus); e porque desta vez os vencedores cuidaram de elaborar antecipadamente o restabelecimento da ordem de pós-guerra (entregando o leste da Europa a Stalin em troca da docilidade dos partidos comunistas franceses e italianos e o abandono do Partido Comunista Grego insurgente). Não obstante, a eclosão da guerra foi suficiente para abrir o caminho de uma revolução estalinista autônoma na China (que Stalin não desejava, uma vez que ela ameaçaria seu domínio exclusivo sobre o “campo socialista”) e para dar um novo ímpeto aos movimentos anticoloniais (que os poderes coloniais europeus naturalmente não queriam, embora fossem finalmente capazes de manter os aspectos mais proveitosos de sua dominação através de um tipo de neocolonialismo econômico que os Estados Unidos já estava praticando).
Ante a perspectiva de um vazio de poder no pós-guerra, os dominadores passara a colaborar com freqüência com seus inimigos declarados para reprimir seu próprio povo. Ao término da guerra franco-germana de 1870-71 o exército alemão vitorioso ajudou a sitiar a Comuna de Paris, possibilitando que os dominadores franceses a esmagassem com mais facilidade. Quando o exército estalinista se aproximou de Varsóvia em 1944 convocou um levante popular na cidade contra os ocupantes nazis, depois esperou alguns dias fora da cidade enquanto os nazis suprimiam os elementos independentes que mais tarde poderiam resistir à imposição do estalinismo. Vimos recentemente algo similar na aliança Bush-Saddam antes da guerra do Golfo, quando, depois de chamar o povo iraquiano a levantar-se contra Saddam, o exército americano massacrou sistematicamente aos iraquianos conscritos fugidos do Kuwait (os quais, se tivessem alcançado seu pais, estariam maduros para a revolta) ao mesmo tempo em que deixou a Guarda Republicana de elite de Saddam intata e livre para esmagar os grandes levantes ao norte e ao sul do Iraque.(2)
Em sociedades totalitárias os agravos são óbvios, mas a revolta é difícil. Em sociedades “democráticas” as lutas são mais fáceis, mas os objetivos estão menos claros. Controlados em grande medida pelo condicionamento inconsciente ou por vastas e aparentemente incompreensíveis forças (“o estado da economia”) e ante a oferta de uma ampla gama de eleições aparentemente livres, torna-se difícil compreender nossa situação. Como um rebanho de ovelhas, somos conduzidos na direção que desejada, mas se deixa margem suficiente às variações individuais para permitir preservar uma ilusão de independência.
Os impulsos ao vandalismo e ao enfrentamento violento podem ser vistos às vezes como tentativas de romper com esta abstração frustrante e para chegar a algo concreto.
Assim como a primeira organização do proletariado clássico foi precedida, entre finais do século XVIII e princípios do século XIX, por um período de atos “criminosos” isolados, dirigidos à destruição das máquinas de produção que privavam as pessoas de seu trabalho, assistimos atualmente à primeira aparição de um vago vandalismo contra as máquinas de consumo que nos privam igualmente da vida. É óbvio que neste caso o valor não está na destruição pela destruição, mas na insubmissão que pode ser posteriormente transformada em um projeto positivo para reconverter as máquinas no sentido de um incremento do poder real dos homens. [“Os dias ruins passarão”, Internacional Situacionista # 7]
(É importante assinalar, todavia, que defender uma reação compreensível diante de um sintoma de crise social, não implica necessariamente ser uma tática recomendável).
Muitos outros fatores podem ser enumerados como estopim de situações radicais. Uma greve pode ampliar-se (Rússia 1905); a resistência popular a qualquer ameaça reacionária pode ultrapassar os limites oficiais (Espanha 1936); o povo pode tirar proveito de uma liberalização simbólica para ir mais além (Hungria 1956, Checoslováquia 1968); um pequeno número de ações exemplares podem catalisar um movimento de massas (as primeiras ocupações pelos direitos civis nos Estados Unidos, maio de 1968 na França); um atropelo particular pode ser a gota d'água que faltava (Watts 1965, Los Angeles 1992); o colapso súbito de um regime pode deixar um vazio de poder (Portugal 1974); uma ocasião especial pode reunir multidões tão numerosas que se torna impossível evitar que expressem seus ressentimentos e aspirações (Tiananmen 1976 e 1989); etc.
Mas uma crise social envolve tantos imponderáveis que poucas vezes é possível predizê-la, e muito menos provoca-la. Em geral parece que a melhor atitude é apoiar projetos que mais nos atraiam pessoalmente, ao mesmo tempo em que procuramos manter suficiente consciência para reconhecer rapidamente novos desdobramentos significativos (perigos, tarefas urgentes, oportunidades favoráveis) que reclamem novas táticas.
A seguir, examinaremos alguns dos cenários decisivos das situações radicais já desencadeadas.
* * *
Efervescência de situações radicais
Uma situação radical é uma revelação coletiva. Em um extremo pode envolver algumas dezenas de pessoas em um bairro ou local de trabalho; em outro extremo se funda em uma situação revolucionária plena que envolve milhões de pessoas. Não é uma questão de número, mas de participação e diálogo sempre públicos e abertos. O incidente que marcou a origem do Free Speech Movement [Movimento pela livre expressão] em 1964 é um exemplo clássico e particularmente atraente. Quando a policia prendeu um ativista pelos direitos civis do campus da Universidade em Berkeley, alguns estudantes se sentaram diante da viatura policial; minutos depois centenas espontaneamente seguiram seu exemplo, rodeando a viatura de forma que esta não podia avançar. Durante as seguintes 32 horas a viatura policial se transformou em uma tribuna para o debate aberto. A ocupação de Sorbona em maio de 68 criou uma situação ainda mais radical ao atrair uma grande parte da população parisiense não estudantil; e a ocupação das fábricas pelos trabalhadores por toda a França se transformou em uma situação revolucionaria.
Em tais situações as pessoas se tornam muito mais suscetíveis para levar a cabo novas iniciativas, mais disposta a questionar antigas crenças, mais animadas em desmascarar a farsa habitual. A cada dia algumas pessoas passam por experiências que as faz questionar o sentido de suas vidas; mas durante uma situação radical praticamente todo mundo faz isso ao mesmo tempo. Quando a máquina se detêm, as próprias peças começam a questionar sua função.
Os chefes são ridicularizados. As ordens não são respeitadas. As separações se dissolvem. Os problemas pessoais se convertem em questões públicas; as questões públicas que pareciam distantes e abstratas se transformam em um assunto imediatamente prático. A velha ordem é examinada, criticada, satirizada. O povo aprende mais sobre a sociedade em uma semana do que em anos de “estudos sociais” acadêmicos ou “tomada de consciência” esquerdista. Experiências longamente reprimidas são revividas.(3)Tudo parece possível — e muito mais coisas vem à tona. O povo não acredita como pode suportar aqueles “velhos dias”. Embora o resultado seja incerto, a experiência pode muitas vezes ser considerara em si mesma valiosa. “Apenas temos tempo... “ escreveu um grafiteiro de maio de 68; ao que outros dois responderam: “Em todo caso, não nos arrependemos!” e “Já são três dias de felicidade”.
Quando o trabalho se interrompe, o frenético ir e vir é substituído pela caminhada ociosa, o consumo passivo pela comunicação ativa. Pessoas que não se conheciam estabelecem animadas conversações pelas esquinas. Os debates se sucedem sem parar, as pessoas que chegam substituem aqueles que marcham para outras atividades ou tratam de conseguir algumas horas de sono, embora ainda normalmente demasiado excitados para dormir por muito tempo. Enquanto alguns sucumbem aos demagogos, outros levam a cabo suas próprias propostas e tomam suas próprias iniciativas. Os espectadores se lançam no torvelinho e passam por transformações incrivelmente rápidas. (Em um belo exemplo de maio de 1968, o diretor do Teatro nacional Odeon se retirou consternado para o fundo do palco quando este foi tomado por multidões radicais; mas depois de considerar a situação durante alguns minutos, avançou e exclamou: “Sim! Agora que o teatro é de vocês, sejam seus defensores, nunca o entreguem a ninguém — metam fogo nele antes de fazer isso!”) [citado no cap. 6 de Enragés y situacionistas en el movimiento de las ocupaciones]
Todavia, nem todo mundo é ganho imediatamente para a causa. Alguns simplesmente se retraem, aguardando o momento em que o movimento se aquiete para que possam recuperar suas posses e suas posições, e vingar-se. Outros vacilam, perdidos entre o desejo e o medo de mudança. O espaço de alguns dias pode não ser suficiente para romper toda uma vida de condicionamento hierárquico, a quebra dos hábitos e rotinas pode ser tão desorientadora quanto liberadora. As coisas acontecem de uma maneira tão rápida que é fácil sentir pânico. Mas mesmo conseguindo manter a calma não é fácil compreender os fatores em jogo suficientemente rápido para determinar o que fazer, que pode parecer óbvio a posteriori. Um dos principais propósitos deste texto é indicar algumas situações típicas recorrentes, de forma que as pessoas possam estar preparadas para reconhecer e explorar tais oportunidades antes que seja demasiado tarde.
Situações radicais são raros momentos onde a mudança qualitativa chega a ser realmente possível. Longe de ser anormais, revelam em que medida estamos quase sempre anormalmente reprimidos. Diante dessas situações a vida "normal" se assemelha a de um sonâmbulo. Embora haja muitos livros escritos sobre revoluções, poucos falam em profundidade sobre estes momentos. Os livros que tratam das revoltas modernas mais radicais quase sempre são meramente descritivos, aportando quiçá alguma insinuação do que as pessoas sentem em tais experiências, mas raramente efetuando alguma abordagem tática útil. Os estudos das revoluções burguesas e burocratas são geralmente as menos relevantes. Em tais revoluções, onde as "massas" jogaram apenas um papel de apoio temporário em uma ou outra direção, sua conduta pode ser analisada em grande medida como movimentos de massas físicas, em termos metafóricos familiares como o movimento de fluxo e refluxo das marés, da oscilação do pêndulo entre a radicalidade e a reação, etc. Mas uma revolução anti-hierárquica requer que as pessoas deixem de ser homogêneas, massas manipuláveis, que vá bem além do servilismo e da inconsciência que lhes sujeitam este tipo de presivibilidade mecanicista.
Nos anos 60 pensava-se geralmente que a melhor maneira de favorecer a desmassificação era formar “grupos de afinidade”: pequenas associações de amigos com estilos de vida e perspectivas compatíveis. Formar tais grupos tinha muitas vantagens obvias. Podiam decidir sobre um projeto e leva-lo a cabo imediatamente; são difíceis de infiltrar; e podem vincular-se a outros quando necessário. Mas mesmo desconsiderando os diversos problemas sob os quais a maioria dos grupos de afinidade dos anos 60 sucumbiram, é preciso reconhecer o fato de que alguns assuntos requerem uma organização em grande escala. Os grandes grupos logo acabam abraçando a hierarquia a menos que logrem organizar-se de forma que líderes sejam desnecessários.
Uma das formas mais simples para começar a organizar uma grande assembléia é fazer com que aqueles que tenham algo a dizer se organizem por turnos, fisicamente ou mediante listas, concedendo um certo tempo a cada um dentro do qual possam dizer o que queiram. (A assembléia de Sorbone e a concentração do Free Speech Movement estabeleceram um limite de três minutos para cada um, que se estendia ocasionalmente por aclamação popular.) Alguns dos oradores propunham projetos específicos que resultavam em grupos menores e mais operativos. (“Alguns de nós pretendemos fazer isto ou aquilo; qualquer um que queira tomar parte pode unir-se a nós em tal hora ou lugar.”) Outros suscitavam temas relacionados com os objetivos gerais da assembléia e seu funcionamento permanente. (A quem incluir? Quando se reunirá de novo? Como tratará nesse ínterim as novas questões urgentes? A quem se delegarão problemas específicos? Com que grau de responsabilidade?) Neste processo os participantes verão logo o que funciona ou não — com que rigor necessitam ser ordenados os delegados, se há a necessidade de um moderador para facilitar a discussão para que não falem todos ao mesmo tempo, etc. São possíveis muitos modos de organização; o essencial é que as coisas prossigam abertas, democráticas e participativas, e que qualquer tendência à hierarquia ou à manipulação seja imediatamente exposta e rechaçada.
Free Speech Movement
Apesar de sua ingenuidade, confusões e falta de uma rigorosa responsabilidade delegada, o Free Speech Movement é um bom exemplo das tendências espontâneas à auto organização prática que surgem em uma situação radical. Se formaram duas dezenas de "centrais" para coordenar impressão, comunicados de imprensa, assistência legal, alimentação, sistemas de alto-falante e outras necessidades, ou encaminhar voluntários que indicaram suas habilidades e disponibilidades para diferentes tarefas. Centrais telefônicas tornaram possível contatar vinte mil estudantes em pouco tempo.
Mas além da mera questão de eficiência prática, e dos temas políticos ostensivos, os insurgentes romperam com toda fachada espetacular descobrindo o sabor da vida real, a comunidade real. Um participante estimou que em alguns meses chegou a conhecer, pelo menos vagamente, a duas ou três mil pessoas - isto em um universo onde se procurava evitar "transformar pessoas em números." Um outro escreveu comovido: "Quando nos defrontamos com uma instituição aparente, desumana, deselegante, e insensível, frustradamente desenhada para despersonalizar e bloquear a comunicação, descobrimos florescer em nós uma presença por cuja ausência protestávamos de coração."(4)
Uma situação radical deve expandir-se ou fracassar. Em casos excepcionais um lugar particular pode servir como base mais ou menos permanente, um centro de coordenação, um refugio da repressão externa. (Sanrizuka, uma região rural próxima a Tokyo ocupada pelos granjeiros locais nos anos 70 em um esforço para bloquear a construção de um novo aeroporto, este espaço foi tão fortemente defendido durante tantos anos que passou a ser utilizado como quartel geral de diversas lutas em todo Japão.) Mas uma localização fixa facilita a manipulação, a vigilância, a repressão, e o comprometimento com sua defesa inibe a liberdade das pessoas mover-se em derredor. As situações radicais se caracterizam sempre por uma grande movimentação: enquanto alguns convergem para locais chave para ver o que ocorre, outros se dispersam para ampliar a contestação para outras áreas.
Uma gestão simples mas essencial em qualquer situação radical é que as pessoas comuniquem o que estão fazendo e por quê. Mesmo que se trate de algo mui limitado essa comunicação é em si mesma exemplar: contribui para ampliar a luta incitando outros à participação, rompe com a usual dependência dos rumores, dos meios espetaculares, e daqueles que dão a si mesmos o título de porta-voz de outras pessoas.
É também um passo crucial de auto esclarecimento. Uma oportunidade de lançar um comunicado coletivo com alternativas concretas: Com quem queremos comunicar? Com que propósito? Quem está interessado neste projeto? Quem está de acordo com esta declaração? Quem discorda? Em quais pontos? Tudo isso pode conduzir a uma polarização quando o povo percebe possibilidades diferentes na situação, pode levar a uma recomposição de pontos de vista, a um agrupamento das pessoas que compartilham da mesma opinião para levar a cabo diversos projetos. Tal polarização esclarece pontos a todos. Cada tendência segue livre para expressar-se e provar na prática suas idéias, e o resultado pode ser mais claramente discernido do que uma mescla de estratégias contraditórias comprometidas com um mínimo denominador comum.
Quando o povo encontra e reconhece uma necessidade prática de coordenação, se coordenará; entretanto, a proliferação de indivíduos autônomos é mais frutuosa que aquela "unidade" superficial organizada desde cima pela qual sempre apelam os burocratas.
As grandes multidões muitas vezes permitem pessoas fazer coisas que seriam imprudentes quando feitas por indivíduos isolados; e ações coletivas, como greves e boicotes, exigem que as pessoas atuem harmoniosamente, ou pelo menos que não atuem contra a decisão da maioria. Mas muitos outros assuntos podem ser decididos diretamente por indivíduos ou por grupos pequenos. Melhor golpear quando o ferro está quente que perder tempo tratando de debater as objeções de massas de espectadores sob o domínio dos manipuladores.
Os situacionistas em maio de 1968
Os pequenos grupos tem todo o direito de escolher seus colaboradores: alguns projetos podem requerer capacidades específicas ou um acordo pleno entre os participantes. Uma situação radical abre possibilidades mais amplas entre um setor mais amplo. Simplificar os temas básicos e romper com as separações habituais, faz que aquele aglomerado de pessoas comuns seja capaz de levar adiante tarefas habitualmente inimagináveis uma semana antes. Em qualquer caso, as massas auto-organizadas são as únicas que podem levar adiante determinadas tarefas — ninguém pode fazer em seu lugar.
Qual é o papel dos indivíduos radicais em tal situação? Está claro que não devem afirmar que representam ou que lideram o povo. Por outro lado é absurdo, a pretexto de evitar hierarquias, propor "a dissolução da massa" e deixar de expor os próprios pontos de vista e de empreender os próprios projetos. Não há por que fazer menos que os indivíduos ordinários "da massa", devem sim expressar seus pontos de vista e empreender seus próprios projetos ou nada em absoluto sucederia. Na prática aqueles radicais que afirmam ter medo de “dizer às pessoas o que fazer" ou de “atuar no lugar dos trabalhadores” terminam geralmente não fazendo nada ou desenrolando intermináveis reiterações de sua ideologia na forma de “informes de discussões entre alguns trabalhadores.” [cf. as críticas da I.S à ICO em “Commencement d’une epoque” e “Preliminaires sur les conseils”.]
Os situacionistas e os Enragés tiveram uma prática consideravelmente mais lúcida e direta em maio de 1968. Durante os primeiros três ou quatro dias da ocupação de Sorbone (14-17 maio) expressaram abertamente seus pontos de vista acerca das tarefas da assembléia e do movimento em geral. Sobre a base daqueles pontos de vista um dos Enragés, René Riesel, foi eleito para o primeiro Comitê de Ocupação de Sorbone, tanto ele como os demais delegados foram reeleitos no dia seguinte.
Riesel e outro delegado (os demais desapareceram aparentemente sem desempenhar suas responsabilidades) se esforçaram por levar a cabo as duas políticas que haviam defendido: manter a democracia total em Sorbone e difundir o mais amplamente possível as chamadas à ocupação das fábricas e a formação dos conselhos de trabalhadores. Mas quando a assembléia permitiu repetidamente que seu Comitê de Ocupação fosse objetado por varias burocracias esquerdistas não eleitas e deixou de afirmar a chamada aos conselhos operários (negando portanto aos trabalhadores o estímulo para que fizessem o que a própria assembléia estava fazendo em Sorbone), os Enragés e os situacionistas abandonaram a assembléia e continuaram sua agitação independentemente.
Não houve nada de antidemocrático neste abandono: a assembléia de Sorbone seguiu livre para fazer o que bem entendesse. Mas quando deixou de responder às tarefas urgentes que a situação exigia e passou a contradizer suas próprias pretensões de democracia, os situacionistas sentiram que aquela assembléia já não poderia ser considerada como um ponto focal do movimento. Este diagnóstico foi confirmado pelo colapso que se seguiu a qualquer pretensão de democracia participativa na Sorbone: depois de sua partida a assembléia já não mais fez eleições, convertendo-se ao estilo típico da esquerda burocrática empurrando suas decisões garganta abaixo das massas passivas.
Enquanto isso ocorria entre cerca de mil pessoas em Sorbone, milhões de trabalhadores ocupavam suas fábricas em todo o país. (Daí o absurdo de caracterizar maio de 1968 como um “movimento estudantil.”) Os situacionistas, os Enragés e umas dezenas de outros revolucionários conselhistas formaram o Conselho para a Manutenção das Ocupações (CMDO) com o objetivo de incitar estes trabalhadores a prescindir dos burocratas sindicais e vincularem-se diretamente uns aos outros para realizar as possibilidades radicais que sua ação colocara em andamento.(5)
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O obrerismo está obsoleto, mas a posição dos trabalhadores prossegue sendo central
“A indignação virtuosa é um poderoso estimulante, mas constitui uma dieta perigosa. É bom recordar o velho provérbio: a cólera é má conselheira. . . . Ali onde tuas simpatias estão fortemente situadas, por alguma pessoa ou pessoas cruelmente maltratadas, das quais não sabes nada exceto que são maltratadas, tua generosa indignação lhes atribui toda sorte de virtudes, e toda sorte de vícios àqueles que as oprimem. Nas a verdade nua e crua é que as pessoas maltratadas são piores que as bem tratadas.”
—George Bernard Shaw, The Intelligent Woman’s Guide to Socialism and Capitalism
“Aboliremos os escravos porque não suportamos olhar em seus olhos.”
(Nietzsche)
Lutar pela libertação não supõe assumir os traços do oprimido. A mais extrema
injustiça da opressão social é que provavelmente ela degrada mais do que
enobrece suas vítimas.
Grande parte da retórica esquerdista tradicional procede de noções obsoletas da ética do trabalho: o burguês seria mau porque não realiza nenhum trabalho produtivo, enquanto que os honoráveis proletários mereceriam os frutos de seu trabalho, etc. Com o trabalho tornando-se a cada vez mais desnecessário e dirigido para fins cada vez mais absurdos, esta perspectiva perdeu todo o sentido que porventura teve algum dia. A questão não é elogiar o proletariado, mas aboli-lo.
A dominação de classe não desapareceu com um século inteiro de demagogia esquerdista fazendo parte da velha terminologia radical soar de forma suficientemente audível. Na medida em que desaparece gradualmente certos tipos de trabalho manual tradicional, setores inteiros da população são condenados ao desemprego permanente. Assim, o capitalismo moderno prossegue proletarizando quase todos os demais. Mecânicos, técnicos, e inclusive profissionais de classe media que antigamente se ufanavam de sua independência (médicos, cientistas, acadêmicos) estão cada vez mais sujeitos à mais crua comercialização, inclusive a uma arregimentação semelhante a uma linha de montagem.
Menos de 1% da população mundial possui 80% do território. Inclusive nos Estados Unidos, os supostamente mais igualitários, a disparidade econômica é extrema e a cada dia se torna ainda mais extrema. Há vinte anos o salário médio de um alto dirigente era 35 vezes maior que o salário médio do operário de fabrica; hoje esse salário é 120 vezes maior. Há vinte anos 0,5% dos mais ricos da população estadunidense possuía 14% da riqueza privada total; agora possuem 30% dessa riqueza. Nas tais proporções não dão a medida completa do poder desta elite. A “riqueza” das classes media e baixa é dedicada quase que inteiramente a cobrir suas necessidades cotidianas, restando pouco ou nada para inverter em qualquer plano significativo que proporcione poder social. Um magnata que possui apenas cinco ou dez por cento de uma sociedade anônima pode normalmente controla-la (devido à apatia da massa não organizada de pequenos acionistas), exercendo assim tanto poder como se possuísse toda a corporação. E bastam apenas algumas poucas corporações maiores (cujos dirigentes estão estreitamente inter-relacionados uns com os outros e com as burocracias mais altas do governo) para comprar, suprimir ou marginalizar os competidores independentes menores, e para efetivamente controlar tanto os políticos chave como os meios de comunicação de massa.
O espetáculo onipresente da prosperidade da classe media está ocultando essa realidade, especialmente nos Estados Unidos onde, devido à sua historia particular (e apesar da violência de muitos de seus conflitos de classe do passado), o povo é mais ingenuamente inconsciente das divisões de classe que em qualquer outra parte do mundo. A extensa variedade de etnias e as miríades de complexas gradações intermediárias tem amortecido e obscurecido a distinção fundamental entre dominantes e dominados. Os estadunidenses possuem mercadorias o suficiente para não prestar atenção ao fato de que alguns possuem toda a sociedade. Exceto aqueles que estão mais abaixo, não podem evitar de perceber melhor estas coisas, mas mesmo assim geralmente assumem que a pobreza é culpa dos pobres, que qualquer pessoa empreendedora sempre encontrará muitas oportunidades, que se não pode ter uma vida satisfatória num lugar sempre pode encontrar um novo ponto de partida em outro. Há um século, quando as pessoas simplesmente tinham que deslocar-se mais a oeste, esta crença tinha algum fundamento; a persistência do espetáculo nostálgico da fronteira obscurece o fato de que as condições presentes são muito diferentes, já não temos nenhum lugar para onde ir.
Os situacionistas utilizam às vezes o termo proletariado (ou mais precisamente, o novo proletariado) em um sentido amplo para referir-se a “todos aqueles que não tem poder sobre suas próprias vidas e sabem disso.” Este uso pode ser pouco rigoroso, mas tem o mérito de acentuar o fato de que a sociedade está dividida em classes, e que a divisão fundamental se dá entre alguns que possuem e controlam tudo e o restante que tem pouco ou nada que trocar ou vender senão sua própria força de trabalho. Em alguns contextos pode ser preferível utilizar outros termos, como “o povo”; mas não quando esto contribui para misturar indiscriminadamente exploradores com explorados.
Não se trata de romantizar aos trabalhadores assalariados que, não surpreendentemente, considerando que o espetáculo é desenhado sobretudo para mante-los enganados, estão com freqüência entre os setores mais ignorantes e reacionários da sociedade. Não se trata de ponderar diferentes agravos para ver quem está mais oprimido. Toda forma de opressão deve ser contestada, e todos podem contribuir nesta contestação — mulheres, jovens, desempregados, minorias, lumpen, boêmios, camponeses, classes medias, e inclusive renegados da elite dominante. Mas nenhum destes grupos pode alcançar uma liberação definitiva sem abolir o fundamento material de todas estas opressões: o sistema de produção de mercadorias e o trabalho assalariado. E esta liberação só pode ser alcançada mediante a auto-abolição coletiva dos trabalhadores assalariados. Apenas eles tem a capacidade não só para conduzir diretamente à supressão de todo o sistema, como também para por de novo as coisas em marcha de um modo fundamentalmente novo.(6)
Não se trata de conceder privilégios especiais a ninguém. Os trabalhadores dos setores essenciais (alimentação, transporte, comunicações, etc.) que rechaçarem a seus chefes capitalistas e sindicatos, e começarem a autogerir suas atividades não terão obviamente interesse em defender o “privilegio” de fazer todo o trabalho; pelo contrario, terão um vivo interesse em convidar aos outros, sejam não trabalhadores ou trabalhadores de setores obsoletos (justiça, exército, comercio, publicidade, etc.), a unir-se a seu projeto para reduzi-lo e transforma-lo. Qualquer um que tome parte cooperará na tomada de decisões; só ficarão fora aqueles que permanecerem a distância reclamando privilégios especiais.
O sindicalismo e o conselhismo tradicionais se inclinaram excessivamente a assumir a divisão de trabalho existente como algo definitivo, como se a vida das pessoas em uma sociedade pós-revolucionária continuasse girando ao redor de trabalhos e locais de trabalho fixos. Inclusive dentro da atual sociedade tal perspectiva está se tornando cada vez mais obsoleta: na medida em que a maioria das pessoas tem trabalhos absurdos e com freqüência apenas temporais, não se identifica de nenhuma forma com eles, e muitos outros não trabalham em absoluto no mercado assalariado, os temas relativos ao trabalho se convertem simplesmente em um aspecto de luta mais geral.
A princípio, pode convir ao movimento que os trabalhadores se identifiquem como tais. (“Nos, trabalhadores de tal ou qual companhia, ocupamos nosso local de trabalho com tais ou quais objetivos; urgimos aos trabalhadores de outros setores a fazer o mesmo.”) A meta última, naturalmente, não é a autogestão das empresas existentes. Pretender, digamos, que os trabalhadores dos meios de comunicação de massa assumam o controle sobre eles apenas porque casualmente trabalham ali seria tão arbitrário quanto o controle atual por parte de qualquer um que casualmente os possua. A gestão dos trabalhadores das condições particulares de seu trabalho deverá combinar-se com a gestão por parte da comunidade dos assuntos de incumbência geral. Donas de casa e outros que trabalham em condições relativamente particulares terão que desenvolver suas próprias formas de organização que lhes capacitem para expressar seus interesses particulares. Mas os conflitos potenciais de interesses entre “produtores” e “consumidores” serão rapidamente superados quando todos estiverem diretamente envolvidos em ambos aspectos; quando os conselhos de trabalhadores se interrelacionarem com os conselhos de comunidades e de bairro; e quando as posições de trabalho fixas gradualmente se extinguirem mediante a obsolescência da maioria dos trabalhos e a reorganização e rotação daqueles que se mantenham (inclusive o trabalho doméstico e o cuidado das crianças).
Os situacionistas estavam verdadeiramente no caminho correto lutando pela formação dos conselhos operários durante as ocupações de fábricas em maio de 1968. Mas é digno de nota que tais ocupações tiveram início mediante ações da juventude em grande medida não trabalhadora. Os situacionistas posteriores a maio de 68 tenderam a cair em uma espécie de obrerismo (se bem que com uma ética decisivamente anti-obrerista), contemplando a proliferação de greves selvagens como o melhor indicador das possibilidades revolucionarias ao mesmo tempo em que dedicavam menos atenção no desenvolvimento de outras áreas de ação. Na realidade ocorre freqüentemente que os operários que são pouco radicais em outros aspectos são forçados a unir-se a lutas selvagens pelo simples fato da descarada traição de seus sindicatos; por outro lado, pode-se resistir ao sistema de muitas outras formas além de greves (incluindo em primeiro lugar evitar o trabalho assalariado na medida do possível). Os situacionistas reconheceram corretamente a autogestão coletiva e a “subjetividade radical” do indivíduo como aspectos complementares e igualmente essenciais do projeto revolucionário, mas sem conseguir uni-las completamente (certamente o fizeram de forma mais restrita que os surrealistas, que, por sua vez, vincularam a revolta política e cultural declarando sua fervorosa adesão a uma ou outra versão da ideologia bolchevique).(7)
As greves selvagens proporcionam possibilidades interessantes, especialmente se os grevistas ocupam seu lugar de trabalho. Isto não só torna sua posição mais segura (previne o fechamento e os fura-greves, e as máquinas e produtos servem como reféns contra a repressão), como reúne a todos, garantindo praticamente a autogestão coletiva da luta e insinuando a idéia da autogestão integral da sociedade sociedade.
Uma vez que o funcionamento habitual da fábrica é interrompido tudo adquire um aspecto diferente. Um triste local de trabalho pode transfigurar-se em um espaço quase sagrado, zelosamente guardado contra a intrusão profana dos chefes ou da polícia. Um observador da ocupação de 1937 em Flint, Michigan, descreveu aos grevistas como “crianças jogando um novo e fascinante jogo. Fizeram um palácio do que havia sido sua prisão.” (Citado em Sit-Down: The General Motors Strike of 1936-1937, de Sidney Fine.) Embora o objetivo da greve fosse simplesmente conquistar o direito de sindicalização, sua organização foi praticamente conselhista. Nas seis semanas que viveram em sua fábrica (utilizando como camas bancos de carro e carrocerias como armários) uma assembléia geral de todos os 1200 trabalhadores se reunia duas vezes por dia para determinar políticas relativas a alimentação, saúde, informação, educação, reclamações, comunicação, segurança, defesa, desportos e entretenimentos, e para eleger comitês responsáveis e freqüentemente rotativos para leva-las a cabo. Houve inclusive um Comitê de Rumores, cujo propósito era rebater a desinformação averiguando a fonte e provando a validez de cada rumor. Fora da fábrica, as mulheres dos grevistas se ocupavam de reunir comida e organizar piquetes, publicidade, e coordenação com os trabalhadores de outras cidades. Algumas das mais audazes organizaram uma Brigada de Imergência de Mulheres que tirou um plano de contingência para formar uma zona de choque em caso de um ataque da polícia contra a fábrica. “Se a polícia quer disparar terá que fazê-lo contra nós.”
Desafortunadamente, embora os trabalhadores mantenham uma posição central em algumas áreas cruciais (serviços, comunicação, transporte), em outros setores tem menor capacidade que no passado. As companhias multinacionais tem normalmente amplas reservas e podem agüentar mais que os trabalhadores ou transferir operações a outros países, enquanto que os trabalhadores tem que resistir um tempo duro sem entrada de salário. Longe de resultar em algo essencial, muitas greves atuais são meras chamadas propondo o fechamento de industrias obsoletas que estão perdendo dinheiro. Assim, embora a greve siga sendo a tática mais básica dos trabalhadores, eles devem também inventar outras formas de luta no trabalho e encontrar vias de relação com lutas em outros terrenos.
Como as greves operárias, as greves de consumo (boicotes) dependem tanto do poder que podem exercer como do apoio que podem recrutar. Há tantos boicotes a favor de tantas causas que, exceto em alguns casos baseados em algum tema moral notavelmente claro, a maioria fracassa. Como ocorre com freqüência nas lutas sociais, as greves de consumidores mais frutíferas são aquelas em que as pessoas estão lutando diretamente por si mesmas, como os antigos boicotes pelos direitos civis no sul dos Estados Unidos ou os movimentos de “autoredução” na Itália e outros lugares em que comunidades inteiras decidiram pagar apenas um determinado percentual das faturas ou dos bilhetes dos meios de transportes. Uma greve de renda é uma ação particularmente simples e poderosa, mas dificilmente alcança o grau de unidade necessário para ter início exceto entre aqueles que não tem nada que perder; é por isto que os maiores desafios exemplares ao fetiche da propriedade privada estão sendo levados a cabo por okupas sem teto.
Naquilo que pode ser chamado de boicote ao avesso, o povo as vezes se une para apoiar alguma instituição popular que está sob ameaça. Reunir dinheiro para una escola ou biblioteca local ou instituição alternativa é normalmente bastante banal, mas tais movimentos geram ocasionalmente um debate público saudável. Em 1974 jornalistas em greve tomaram um periódico importante da Corea do Sul e começaram a publicar exposições das mentiras e repressão governamentais. Em um esforço por arruinar o periódico sem ter que suprimi-lo abertamente, o governo pressionou a todos os anunciantes para que retirassem seus anúncios do periódico. O público respondeu comprando milhares de anúncios individuais, utilizando seu espaço para manifestações pessoais, poemas, citações de Tom Paine, etc. A “Coluna de Apoio à Liberdade de Expressão” teve um incremento de páginas a cada número e sua circulação cresceu sucessivamente até que o periódico foi finalmente suprimido.
Mas as lutas de consumidores são limitadas pelo fato de que os consumidores são os receptores finais do ciclo da economia: podem exercer uma certa pressão mediante protestos, boicotes ou distúrbios, mas não controlam os mecanismos de produção. No incidente coreano mencionado acima, por exemplo, a participação do público só foi possível graças à tomada do periódico por parte dos trabalhadores.
Uma forma particularmente interessante e exemplar de luta operária é o que se chama as vezes “greve social” ou “greve de doação”, onde as pessoas prosseguem, com seus trabalhos mas de forma que prefigure uma ordem social livre: os trabalhadores distribuem gratuitamente os bens que produzem, os empregados cobram menos da clientela, os trabalhadores do transporte permitem circular livremente os passageiros. Em fevereiro de 1981, 11.000 trabalhadores de telefones ocuparam as centrais através de toda a Columbia Britânica e mantiveram todos os serviços de telefone sem cobrança durante seis dias antes de serem enganados pelo sindicato e abandonassem aquela empreitada. Além de conseguir muitas vitórias, parece que passaram um tempo maravilhoso.(8) Pode-se imaginar muitas formas de ir além e chegar a ser mais seletivos, como bloquear chamadas comerciais e governamentais enquanto se permite que se ocorram livremente as chamadas pessoais. Os trabalhadores postais poderiam fazer o mesmo com as cartas; os de transporte poderiam continuar enviando bens necessários enquanto rechaçam transportar a polícia ou tropas militares...
Mas este tipo de greve não teria sentido para a grande maioria de trabalhadores cujos trabalhos não servem a um propósito sensato. (O melhor que estes trabalhadores podem fazer é denunciar publicamente o absurdo de seu próprio trabalho, como fizeram alguns publicitários durante maio de 1968.) Mais ainda, até mesmo o trabalho útil é tão freqüentemente dividido que os grupos separados de trabalhadores podem aportar poucas mudanças por si mesmos. E a pequena minoria que consegue produzir produtos acabados e comercializáveis (como fizeram os trabalhadores que em 1973 tomaram a fábrica falida de relógios Lip em Besançon, França, fazendo-a voltar a funcionar por eles mesmos) continua normalmente dependendo do financiamento comercial e das redes de distribuição. Quando excepcionalmente tais trabalhadores conseguem prosperar por eles mesmos, simplesmente tornam-se uma companhia capitalista a mais; mais freqüentemente, suas inovações autogeridas acabam simplesmente racionalizando a operação em beneficio dos proprietários. Uma “Estrasburgo fabril “ só pode ocorrer se os trabalhadores que se encontram em uma situação como a da Lip utilizam as facilidades e a publicidade de forma que lhes permita ir mais longe que os trabalhadores da Lip (que lutavam simplesmente para salvar seus empregos) chamando outros a unir-se a eles na superação de todo o sistema de produção mercantil e do trabalho assalariado. Mas é pouco provável que isto ocorra até que surja um movimento suficientemente amplo que aumente as perspectivas das pessoas e compense os riscos — como em maio de 1968, quando a maioria das fábricas da França estavam ocupadas:
O que poderia ter sucedido em maio de 1968
Se, em uma simples e grande fábrica, entre 16 e 30 de maio, fosse constituída uma assembléia geral enquanto um conselho com todos os poderes de decisão e execução, expulsando os burocratas, organizando sua autodefesa e convocando os grevistas de todas as empresas a se unirem a eles, este passo qualitativo poderia levar imediatamente o movimento ao seu momento decisivo. . . . Um número mui amplo de empresas seguiria o caminho aberto dessa forma. Esta fábrica poderia imediatamente tomar o lugar da duvidosa e em todos os sentidos excêntrica Sorbone dos primeiros dias e chegar a ser o centro real do movimento das ocupações: delegados genuínos dos numerosos conselhos que praticamente já existiam em alguns dos edifícios ocupados, conselhos que poderiam se impor em todos os ramos da industria reunidos nessa base. Tal assembléia poderia proclamar a expropriação de todo capital, incluindo o capital do estado; anunciar que todos os meios de produção do pais seriam dali em diante propriedade coletiva do proletariado organizado em democracia direta; e chamar diretamente (apoderando-se finalmente de alguns meios de telecomunicação, por exemplo) aos trabalhadores do mundo inteiro a apoiar esta revolução. Alguns dirão que tal hipótese é utópica. Nós respondemos: foi precisamente por isso, pelo movimento das ocupações estar objetivamente em muitos momentos a apenas uma hora deste resultado, que infundiu tanto terror, inteiramente visível para qualquer um diante da impotência do estado, do pânico do Partido Comunista, e da conspiração silenciosa mantida no que dizia respeito a sua gravidade. ["O começo de uma nova época", Internacional Situacionista # 12]
Os que impediram que isto sucedesse foram sobretudo os sindicatos, particularmente o maior do pais: a CGT dominada pelo Partido Comunista.
Inspirados pela juventude rebelde que havia combatido a polícia nas ruas e tomado Sorbone e outros edifícios públicos, dez milhões de trabalhadores ignoraram seus sindicatos e ocuparam praticamente todas as fábricas e muitos dos escritórios do país, lançando a primeira greve geral de ocupação da historia. Mas a maioria daqueles trabalhadores ficaram sem saber o que fazer depois que permitiram que a burocracia sindical se insinuasse naquele movimento que no primeiro momento trataram de impedir. Os burocratas fizeram tudo que puderam para romper e fragmentar o movimento: chamaram greves relâmpago, criaram falsas "organizações de base" compostas por fieis membros do Partido Comunista; se apossaram dos sistemas de alto-falante; chamaram votações defendendo o retorno ao trabalho; e o mais crucial: o fecharam as portas da fábrica para manter os trabalhadores isolados uns dos outros e dos outros insurgentes (com o pretexto de "defender-se contra os provocadores de fora"). Os sindicatos a seguir abriram negociações com os empresários e o governo em torno de um pacote de bonificações salariais e folgas. Este suborno foi rechaçado enfaticamente por uma ampla maioria de trabalhadores, que tinham uma noção, embora confusa, de que cabia uma proposta mais radical na agenda. Nos primeiros dias de junho, De Gaulle apresentou a alternativa pau ou cenoura, novas eleições ou guerra civil, isso finalmente intimidou a muitos trabalhadores, que voltaram ao trabalho. Houve todavia numerosa resistência, mas o isolamento uns dos outros permitiu aos sindicatos dizer a cada grupo que todos os demais haviam retornado ao trabalho, na medida que acreditavam que estavam sozinhos, renunciavam.
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Métodos de confusão e cooptação
Como em maio de 1968, quando os países mais desenvolvidos se vêem ameaçados por uma situação radical, utilizam normalmente a confusão, as concessões, toques de recolher, distrações, desinformação, fragmentação, antecipação, postergação e outros meios para desviar a atenção, dividindo e cooptando a oposição, reservando a repressão física aberta como último recurso. Esses métodos, que vão da sutileza ao ridículo,(9) são tão numerosos que seria impossível mencionar aqui mais do que alguns.
Um método comum para confundir os problemas é distorcer a composição aparente de forças projetando diversas posições em um esquema linear, esquerda contra direita, implicando que se te opões a um dos lados estás a favor do outro. O espetáculo do comunismo contra o capitalismo serviu a este propósito durante meio século. A partir do recente colapso desta farsa, a tendência passou a ser declarar um consenso pragmático global centrista, agrupando toda oposição como “extremistas” lunáticos-marginais (fascismo e fanatismo religioso à direita, terrorismo e “anarquia” à esquerda).
O clássico método do dividir-para-reinar anteriormente discutido: fazer com que os explorados se fragmentem em uma multidão de identidades grupais fechadas, que podem ser manipuladas dirigindo suas energias a disputas uns contra os outros. Ao inverso, podem unir-se às classes oponentes mediante a histeria patriótica ou outros meios. As frentes populares, as frentes unidas e coalizões similares servem para obscurecer os conflitos fundamentais de interesses em nome de uma oposição unida frente ao inimigo comum (burguesia + proletariado contra regime reacionário; estratos militares e burocráticos + camponeses contra a dominação estrangeira). Em tais coalizões o grupo superior geralmente tem os recursos materiais e ideológicos para manter seu controle sobre o grupo inferior, que é obrigado a adiar a ação auto-organizada por e para si mesmo até que seja demasiado tarde. Quando se obtém a vitória sobre o inimigo comum, o grupo superior consolida seu poder (com freqüência mediante uma nova aliança com elementos do grupo derrotado) para esmagar os elementos radicais do grupo inferior.
Qualquer vestígio de hierarquia dentro de um movimento radical será utilizado para dividi-lo e miná-lo. Se não houver líderes cooptaveis, são criados mediante uma intensiva exposição mediática. Os governantes podem negociar com os líderes e torná-los responsáveis por um dominio de seus seguidores; uma vez cooptados, podem também estabelecer redes similares de comando, possibilitando que uma grande massa de gente seja colocada sob controle sem que os dominadores tenham que tratar com todos eles aberta e simultaneamente.
A cooptação de líderes serve não apenas para separa-los das pessoas, mas também para dividir as pessoas entre si— alguns vêem a cooptação como uma vitoria, outros a denunciam, outros duvidam. Como a atenção se desloca desde ações participativas até o espetáculo das celebridades, líderes distantes que debatem temas distantes, a maioria das pessoas se aborrece e se desilude. Ao sentir que os assuntos estão fora de seu alcance (talvez inclusive secretamente aliviada de que outro se ocupe deles), voltam à sua antiga passividade.
Outro método para desanimar a participação popular é enfatizar problemas que parecem requerer habilidades especializadas. Um exemplo clássico foi o estratagema usado por certos chefes militares alemães em 1918 no momento em que conselhos de trabalhadores e soldados emergiam em conseqüência do colapso alemão ao final da I Guerra Mundial, tais chefes militares ficaram potencialmente com o pais em suas mãos.(10)
O terrorismo freqüentemente tem servido para enfraquecer o impulso das situações radicais. O terrorismo deixa as pessoas confusas, converte-as em espectadores que buscam ansiosamente as últimas notícias e especulações. Longe de debilitar o estado, o terrorismo parece confirmar a necessidade de reforçá-lo. Se os espetáculos terroristas não surgem espontaneamente quando os poderosos precisam dele, o próprio estado pode produzi-los mediante provocadores. (Ver Sobre o terrorismo e o estado de Sanguinetti e a última parte do Prefacio à quarta edição italiana da “Sociedade do espetáculo.” de Debord). O movimento popular pode impedir que alguns indivíduos levem a cabo ações terroristas ou outras ações irrefletidas que podem desvia-lo de seu propósito e destrui-lo tão seguramente como se fosse obra de um provocador. A única solução é criar um movimento com táticas tão firmemente consistentes e não manipulativas a ponto de que qualquer pessoa possa reconhecer tanto a estupidez individual como as provocações da polícia.
Uma revolução anti-hierárquica deve ser uma “conspiração aberta.” Obviamente há coisas que requer segredo, especialmente sob os regimes mais repressivos. Mas mesmo em tais casos os meios não deveriam ser inconsistentes com a meta última: a supressão de todo poder separado mediante a participação consciente de todos. O segredo tem com freqüência o resultado absurdo de que a polícia é a única que sabe o que está passando, e pode assim infiltrar e manipular um grupo radical sem que ninguém mais tenha consciência disso. A melhor defesa contra a infiltração é assegurar-se de que não há nada tão importante que justifique uma infiltração, ou seja, que nenhuma organização radical exerça um poder separado. A melhor salvaguarda está no número: uma vez que milhares de pessoas estão abertamente mescladas entre si, não ocorre absolutamente nada se alguns poucos espiões se infiltram entre eles.
Inclusive em ações de pequenos grupos a segurança depende com freqüência de um máximo de publicidade. Quando alguns dos participantes no escândalo de Estrasburgo começaram a ter medo e sugeriram moderar as coisas, Mustapha Khayati (o delegado da IS que foi o principal autor do panfleto Sobre a miséria no meio estudantil) propôs que a atitude mais segura não deveria ser evitar ofender demasiado às autoridades — como se insultar apenas moderada e indecisamente resultasse em elogios! — mas perpetrar um escândalo tão amplamente divulgado que não pudesse sofrer represálias.
* * *
Voltando às ocupações de fábricas de maio de 1968, suponhamos que os trabalhadores franceses rechaçassem as manobras dos burocratas e estabelecessem uma rede conselhista através de todo o pais. O que sucederia?
Diante de tal eventualidade, a guerra civil seria naturalmente inevitável. . . . A contra-revolução armada sairia imediatamente a campo. Mas sem certeza de que iria vencer. Parte das tropas obviamente se amotinaria. Os trabalhadores aprenderiam pegar em armas, e certamente não construiriam mais nenhuma outra barricada (uma bela forma de expressão política no começo do movimento, mas obviamente ridícula do ponto de vista estratégico). . . . A intervenção estrangeira se produziria inevitavelmente . . . Provavelmente começando pelas forças da OTAN, mas com o apoio direto ou indireto do Pacto de Varsóvia. Mas tudo dependeria mais uma vez do proletariado europeu: tudo ou nada. [“O começo de uma nova época”, Internacional Situacionista, # 12]
A grosso modo, o significado da luta armada varia de modo inverso ao grau de desenvolvimento econômico. Nos países mais subdesenvolvidos as lutas sociais tendem a reduzir-se a lutas militares, porque as massas empobrecidas pouco podem fazer sem armas diante dos danos provocados pelos dominadores, especialmente quando sua tradicional auto-suficiência foi destruída por uma economia de monocultivo destinada à exportação. (Mas mesmo se vencem militarmente, podem ser normalmente dominados pela intervenção estrangeira ou pressionados a submeter-se à economia mundial, a menos que outras revoluções paralelas em outros lugares abram novas frentes.)
Nos países mais desenvolvidos a força armada tem relativamente menor significado, embora possa, eventualmente, ser um fator importante em certas conjunturas críticas. É possível, embora não muito eficiente, forçar pessoas a fazer trabalhos manuais simples sob a mira de uma pistola. Mas não é possível fazer isso com pessoas que trabalham com papel ou ordenadores dentro de uma sociedade industrial complexa — há ali demasiadas oportunidades de fastidiosos “erros” dos quais resulta impossível averiguar o autor. O capitalismo moderno requer uma certa cooperação e inclusive uma participação semi-criativa de seus trabalhadores. Nenhuma grande empresa poderia funcionar um único dia sem a autoorganização espontânea dos trabalhadores, que reagem diante de problemas imprevistos, compensam erros dos gestores, etc. Se os trabalhadores se comprometem em uma greve “de zelo” onde não façam outra coisa senão seguir estritamente todos os regulamentos oficiais, o funcionamento total será retardado ou até mesmo completamente interrompido (conduzindo os dirigentes, que não podem condenar abertamente tal rigor, a uma posição divertidamente delicada ao ter que recomendar que os trabalhadores cumpram com seu trabalho sem ser demasiadamente rigorosos). O sistema sobrevive apenas porque a maioria dos trabalhadores são relativamente apáticos e, para não criar problemas, cooperam o suficiente para que as coisas marchem.
As revoltas isoladas podem ser reprimidas de modo individual; mas se um movimento se amplia suficientemente rápido, como en maio de 1968, centenas de milhares de soldados e policiais nada podem fazer diante de milhões de trabalhadores em greve. Tal movimento apenas pode ser destruído de dentro para fora. Se as pessoas não sabem o que fazer, as armas não podem ajuda-las; se sabem o que fazer as armas não podem detê-las.
Apenas em certos momentos as pessoas ficam suficientemente “unidas” para rebelar-se com êxito. Os dominadores mais lúcidos sabem que só estão seguros enquanto puderem conter tais intentos antes de que desenvolvam demasiado impulso e autoconsciência, seja mediante repressão física direta, seja mediante as varias espécies de desvios mencionados acima. Pouco importa se as pessoas se dêem conta mais tarde de que foram enganadas, que tiveram a vitória em suas mãos sem saber: uma vez que a oportunidade passou, já é tarde demais.
Mesmo situações ordinárias são plenas de confusão, mas os problemas não são normalmente tão urgentes. Em uma situação radical as coisas se simplificam na medida em que essa situação se acelera: os problemas se tornam mais claros, mas há menos tempo para resolve-los.
Um caso extremo foi dramatizado na famosa cena de Potemkin de Eisenstein. Os marinheiros amotinados, com as cabeças cobertas por uma lona, estão alinhados para serem fuzilados. Os guardas apontam seus rifles e recebem a ordem de disparar. Um dos marinheiros grita: “Irmãos! Sabeis contra quem disparais?” Os guardas vacilam. Se dá outra vez a ordem. Sob uma certa angustia os guardas baixam suas armas. Ajudam aos marinheiros a atacar o depósito de armas, se unem a eles contra os oficiais, e a batalha é logo ganha.
Note-se que mesmo neste violento confronto o resultado é mais um assunto de autoconsciência do que de força bruta: uma vez que os guardas passam para o lado dos marinheiros, a luta efetivamente se acaba. (O resto da cena de Eisenstein — uma grande luta entre um oficial malvado e um herói revolucionário martirizado — é um mero melodrama.) Em contraste com a guerra, onde dois lados distintos se enfrentam conscientemente um ao outro, “a luta de classes não é apenas uma luta lançada contra um inimigo externo, a burguesia, é também a luta do proletariado contra si mesmo: contra os efeitos devastadores e degradantes do sistema capitalista sobre sua consciência de classe” (Lukács, Historia e consciência de classe). A revolução moderna tem a característica peculiar de que a maioria explorada ganha automaticamente no momento em que se torna coletivamente consciente do jogo que se joga. O oponente do proletariado não é em última instancia nada mais que o produto de sua própria atividade alienada, seja no aspecto econômico do capital, seja no aspecto político das burocracias sindicais e políticas, ou na forma psicológica do condicionamento espetacular. Os dominadores são uma minoria tão ínfima que seriam esmagados imediatamente se não conseguissem enganar a uma ampla proporção da população para que se identifiquem com eles, ou pelo menos considerem o sistema como legítimo; e especialmente a ponto de provocar divisões na população
A lona na cara, que desumaniza aos amotinados e facilita o disparo dos guardas, simboliza a tática do dividir-para-reinar. O grito “Irmãos!” representa a contra-tática da confraternização.
Embora a confraternização refute a mentira sobre o que está sucedendo em outras partes, seu poder reside en sua maior parte no efeito emocional do encontro humano direto, que lembra aos soldados que os insurgentes são pessoas não essencialmente diferentes deles mesmos. O estado trata naturalmente de impedir tal contato levando tropas de outras regiões que não estão familiarizadas com aquilo que ocorre, e que nem mesmo falam a mesma lingua; movimentando-as rapidamente para evitar uma contaminação excessiva com as idéias rebeldes. (Algumas das tropas russas enviadas para esmagar a revolução húngara de 1956 foram instruídas de que estavam na Alemanha e que as pessoas que enfrentavam nas ruas eram Nazis ressurgidos!)
Para descobrir e eliminar os elementos mais radicais, um governo às vezes provoca deliberadamente uma situação que levará a uma desculpa para a repressão violenta. Este é um jogo perigoso, sem dúvida, porque, como no incidente do Potemkin, forçar a questão pode provocar que as forças armadas passem para o lado do povo. Do ponto de vista dos dominadores a estratégia ótima é brandir a ameaça apenas o suficiente, de forma que não necessite arriscar o momento decisivo. Isto funcionou na Polônia em 1980-81. Os burocratas russos sabiam que invadir a Polônia poderia provocar sua própria queda; mas a constante ameaça de tal invasão conseguiu intimidar os trabalhadores radicais polacos, que poderiam facilmente ter derrubado o estado, por tolerar a presença de forças militares-burocráticas dentro de Polônia. Estas puderam finalmente reprimir o movimento sem ter que chamar os russos.
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“Os que fazem meias revoluções apenas cavam suas próprias tumbas”. Um movimento revolucionário não pode obter uma vitoria local e depois esperar coexistir pacificamente com o sistema até estar pronto para intentar algo mais. Todos os poderes existentes deixarão de lado suas diferenças para destruir qualquer movimento popular verdadeiramente radical antes que se estenda. Se não podem esmagá-lo militarmente, o estrangularão economicamente (as economias nacionais são agora tão globalmente interdependentes que nenhum país está imune a tal pressão). O único modo de defender uma revolução é estendê-la, tanto qualitativamente como geograficamente. A única garantia contra a reação interna é a liberação radical de todos os aspectos da vida. A única garantia contra a intervenção externa é a rápida internacionalização da luta.
A expressão mais profunda da solidariedade internacional é, portanto, fazer uma revolução paralela em seu próprio país (1848, 1917-1920, 1968). Se isto não é possível, a tarefa mais urgente é pelo menos prevenir a intervenção contra-revolucionária desde o próprio país, como quando os trabalhadores ingleses pressionaram a seu governo para que não apoiasse aos estados escravistas durante a Guerra Civil Americana (inclusive quando isto significava maior desemprego devido à queda na exportação de algodão); ou quando os trabalhadores ocidentais entraram em greve e se sublevaram contra a intenção de seus governos de apoiar as forças reacionárias durante a guerra civil que sucedeu à revolução russa; ou quando pessoas da Europa e da América se opuseram à repressão de seus países às revoltas anticoloniais.
Desafortunadamente, até mesmo estes esforços mínimos necessários são bastante raros. O apoio internacional positivo é todavia mais difícil. Enquanto os dominadores mantiverem o controle dos países mais poderosos, a ajuda pessoal direta se complica e se limita. As armas e outras provisões podem ser interceptadas. Às vezes até mesmo as comunicações chegam demasiado tarde.
Algo transcendente é o anuncio de um grupo que renuncia seu poder sobre outro ou que reclama contra outro. A revolta fascista de 1936 na Espanha, por exemplo, teve uma de suas bases principais no Marrocos espanhol. Muitas das tropas de Franco eram marroquinas e as forças antifascistas poderiam ter explorado este fato declarando Marrocos independente, incitando deste modo uma revolta na retaguarda de Franco e dividindo suas forças. A provável ampliação de tal revolta a outros países árabes poderia haver desviado ao mesmo tempo as forças de Mussolini, que apoiavam a Franco, para defender as possessões italianas no norte da África. Mas os líderes do governo da Frente Popular espanhola rechaçaram esta idéia por medo de que o estímulo de tal anticolonialismo alarmaria a França e a Inglaterra, dos quais estavam esperando ajuda. Desnecessário dizer que esta ajuda nunca chegou de forma alguma.(11)
De modo similar, se antes que os seguidores de Khomeini pudessem consolidar seu poder, os iranianos insurgentes em 1979 tivessem apoiado a total autonomia dos kurdos, baluchis e azerbanes, poderia tê-los conquistado como aliados firmes das tendências iranianas mais radicais e poderia ter estendido a revolução aos países adjacentes donde se haviam trasladado porções daqueles povos, enquanto socavavam simultaneamente aos seguidores reacionários de Khomeini no Irã.
Estimular a autonomia de outros não implica apoiar qualquer organização ou regime que possa aproveitar-se dele. Trata-se simplesmente de deixar que os marroquinos, os kurdos, ou seja lá quem for, resolverem seus próprios acontecimentos. A esperança é que o exemplo de uma revolução anti-hierárquica em um pais inspire outros a contestar suas próprias hierarquias.
Esta é nossa única esperança, mas não é inteiramente irreal. O contagio de um movimento genuinamente liberado nunca deve ser desprezado.
NOTAS
1. Sobre a revolução cultural, ver “Le point d’explosion de l’ideologie en Chine”, International Situationista # 11 y Simon Leys: The Chairman’s New Clothes.
2. “Na medida em que os chiítas e kurdos combatiam o regime de Saddam Hussein e os partidos de oposição iraquiana trataram de remendar juntos um futuro democrático, os Estados Unidos se encontraram na incômoda posição de apoiar a continuação de uma ditadura de partido único no Iraque. As declarações do governo dos Estados Unidos, incluída a do presidente Bush, acentuaram o desejo de ver Saddam Hussein derrotado, mas não um Iraque dividido por uma guerra civil. Ao mesmo tempo, os oficiais da administração de Bush insistiam que a democracia não é atualmente uma alternativa viável para o Iraque. . . Isto pode explicar o fato de que até aqui, a administração rechaçasse reunir-se com os líderes da oposição iraquiana no exílio. . . . ‘Os árabes e os americanos tem a mesma agenda’, disse um diplomata da coalizão (contra Iraque). ‘Queremos o Iraque nos mesmos limites e que Sadam desapareça. Mas aceitaremos Saddam em Baghdad para manter o Iraque como um estado’”. (Christian Science Monitor, 20 março 1991).
3. “É impressionante a memória do povo em reter seu próprio passado revolucionario. Os eventos presentes sacudiram esta memoria. As datas que nunca aprenderam na escola, as canções nunca cantadas abertamente, são recordadas em sua totalidade. . . . O ruído, o ruído, o ruído todavia soa em meus ouvidos. Os gritos, os slogans, os cantos e bailes. As portas da revolução parecem abertas outra vez, depois de quarenta e oito anos de repressão. Naquele dia simplesmente tudo mudou de perspectiva. Nada foi dado por Deus, tudo devia ser feito pelo homem. As pessoas podiam ver sua miséria e seus problemas em uma perspectiva histórica. . . . Passou uma semana, e já parecem vários meses. Cada momento foi vivido intensamente. Já é difícil recordar o aspecto anterior dos periódicos, ou o que as pessoas diziam. Porque as revoluções não acontecem sempre?” (Phil Mailer, Portugal: A revolução impossível)
4. Um dos momentos mais intensos foi quando os grevistas em volta da delegacia de polícia evitaram um confronto potencialmente violento com uma turba hostil de estudantes conservadores que tentavam interromper a assembléia permanecendo completamente em silencio durante meia hora. Sem receber vento para suas velas, os provocadores se aborreceram, se desconcentraram, e finalmente se dispersaram. Tal silencio coletivo tem a vantagem de dissolver reações compulsivas de ambos os lados; já que não ha nada implícito nele, como o duvidoso conteúdo de muitos slogans e canções. (Cantar “We Shall Overcome” [“Venceremos”: canção popular do movimento pelos direitos civis] tem servido também para acalmar pessoas em situações difíceis, mas com o preço de sentimentalizar a realidade).
A melhor recordação do FSM é O Movimento da Livre Expressão de David Lance Goines (Ten Speed Press, 1993).
5. Sobre maio de 1968 ver René Viénet: Enrages e situacionistas no movimento das ocupações e “O começo de uma nova época”, em I.S. # 12. Também se recomenda Roger Grégoire e Fredy Perlman: Worker-Student Action Committees, France May ’68 (Black & Red, 1969).
6. “A classe trabalhadora não apenas FECHARÁ as industrias, como também as REABRIRÁ, para gerir apropriadamente as atividades necessarias para preservar a saúde e a paz pública. Se a greve continuar, a classe trabalhadora pode sentir-se inclinada a evitar o sofrimento público reabrindo mais e mais atividades SOB SUA PRÓPRIA DIREÇÃO. E é por isso que dizemos que estamos em uma estrada que conduz — NINGUÉM SABE AONDE!” (Anuncio na véspera da greve geral de Seattle de 1919). Ver Jeremy Brecher: Strike! (South End, 1972), pp. 101-114. Lembranças mais extensivas se incluem em Root & Branch: The Rise of the Workers’ Movements e em Revolution in Seattle, de Harvey O’Connor.
7. Raoul Vaneigem (que escreveu incidentalmente uma breve e boa historia crítica sobre surrealismo) representou a expressão mais clara de ambos aspectos. Seu livreto De la grève sauvage à l’autogestion généralisée (“Da greve de ocupação à autogestão generalizada”), recapitula proveitosamente uma série de táticas básicas durante as greves de ocupação e outras situações radicais assim como várias possibilidades de organização social pós-revolucionária. Desafortunadamente está também adornado com a inflada verborréia característica dos escritos pós-SI de Vaneigem, atribuindo às lutas operárias um conteúdo vaneigemista desnecessário e injustificado. O aspecto da subjetividade radical se coagulou em uma ideologia hedonista tediosamente repetida nos últimos livros de Vaneigem (O livro dos plazeres, etc.), lidos como cândidas paródias das idéias tratadas tão incisivamente em seus trabalhos anteriores.
8. “Estamos no segundo dia [de greve], estou cansada, mas levando em conta as sensações positivas que ocorrem neste lugar, a fadiga não prevalece. . . . . Quem esquecerá a cara dos diretores quando lhes dissemos que o controle agora era nosso, e que seus serviços já não eram obviamente necessários. . . . Tudo continua normal, exceto que não faturamos as chamadas. . . . Estamos também fazendo amigos nos outros departamentos. Os rapazes do andar de baixo nos ajudam e estão aprendendo nosso trabalho. . . . Estamos voando. . . . Nadando em adrenalina pura. É como se possuíssemos toda a maldita empresa. . . O aviso na porta diz, CO-OP TEL: SOB NOVA DIREÇÃO — PROIBIDO DIRETORES”. (Rosa Collette, “Operators Dial Direct Action,” Open Road,Vancouver, Spring 1981.)
9. “Uma companhia sulafricana está vendendo um veículo antidisturbios que emite música pelos alto-falantes para acalmar os nervos dos indivíduos potencialmente problemáticos. O veículo, já adquirido por uma nação negra, que a companhia não identifica, carrega também um canhão de água e um lançador de gás”. (AP, 23 setembro, 1979.)
10. “Na tarde de 10 de novembro, quando o Comando Supremo estava em um Spa, um grupo de sete homens se apresentou no quartel. Era o ‘Comitê Executivo’ do Conselho Supremo de Soldados do Quartel General. Suas demandas eram algo confusas, mas obviamente esperavam jogar um papel no comando da Armada durante seu retiro. Eles queriam ao menos o direito de referendar as ordens do Comando Supremo e assegurar que o exército não fosse utilizado para nenhum propósito contra-revolucionario. Os sete soldados foram cortesmente recebidos pelo lugar-tenente coronel Wilhelm von Faupel, que havia ensaiado cuidadosamente para a ocasião. .. . . Faupel deixou os delegados na setor de mapas do Comando Supremo. Tudo foi demarcado em um mapa gigantesco que ocupava toda uma parede: um enorme complexo de estradas, estradas de ferro, pontes, comutadores, tubos, postos de comando e depósitos de provisões — todo um intrincado encaixe de linhas vermelhas, verdes, azuis e negras que convergiam em um estreito gargalo de garrafa nas pontes cruciais do Rhin. .. . . Faupel então voltou com eles. O Comando Supremo não tinha objeção aos conselhos de soldados, disse, mas fez que seus ouvintes se sentissem competentes para dirigir a evacuação geral do exército alemão ao longo destas linhas de comunicação? . . . Os soldados desconcertados olhavam inquietos o imenso mapa. Um deles concordou que isso não era o que eles haviam pensado realmente — ‘Este trabalho bem que poderia ser deixado a cargo dos funcionários públicos’. Ao final, os sete soldados deram de boa vontade seu apoio aos oficiais. Mais que isso, praticamente suplicaram para que os funcionários públicos ficassem com os comandos. . . . Sempre que uma delegação do conselho de soldados aparecia no Quartel Supremo, o coronel Faupel voltava a repetir sua velha performance; sempre funcionou.” (Richard Watt, The Kings Depart: Versailles and the German Revolution.)
11. Se esta questão chegasse ao conhecimento dos trabalhadores espanhóis (que já havia prescindido do vacilante governo da Frente Popular colhendo as armas e resistindo ao golpe fascista por si mesmos, no processo que desencadeou a revolução) eles provavelmente concordariam em conceder a independência a Marrocos. Em vez disso acabaram dominados pelos líderes políticos — inclusive muitos líderes anarquistas — ao tolerar este governo em nome da unidade antifascista, não puderam tomar consciência de tais temas.
A revolução espanhola continua sendo a experiência revolucionaria mais rica da historia, embora complicada e obscurecida pela guerra civil simultânea contra Franco e pelas agudas contradições dentro do campo antifascista, que — junto a dois ou três milhões de anarquistas e anarcosindicalistas e um contingente consideravelmente mais pequeno de marxistas revolucionários (o POUM) — republicanos burgueses, autonomistas étnicos, socialistas e estalinistas, com os últimos em particular fazendo tudo o que estava a seu alcance para reprimir a revolução. As historias mais compreensivas desse tema são Revolution and the War in Spain de Pierre Broué e Emile Témime e The Spanish Revolution de Burnett Bolloten (este último foi substancialmente incorporado no monumental trabalho final de Bolloten, The Spanish Civil War). Alguns bons relatos de primeira mão estão em Homage to Catalonia, de George Orwell [versão em português: Lutando na Espanha], The Spanish Cockpit, de Franz Borkenau y Red Spanish Notebookde Mary Low y Juan Breá. Outros livros dignos de serem lidos são Lessons of the Spanish Revolution, de Vernon Richards, To Remember Spain, de Murray Bookchin, The Spanish Labyrinth, de Gerald Brenan, Sam Dolgoff: The Anarchist Collectives,Abel Paz: Durruti: The People Armed, y Victor Alba y Stephen Schwartz’s Spanish Marxism versus Soviet Communism: A History of the P.O.U.M.
Fim do capítulo 3 de “A Alegria da Revolução” de Ken Knabb, tradução de Railton Sousa Guedes. Versão original: The Joy of Revolution.
No copyright.
Capítulo 1: Coisas da vida
Utopia ou quebra. "Comunismo" estalinista e "socialismo" reformista são simples variantes do capitalismo. Democracia representativa versus democracia delegativa. Irracionalidades do capitalismo. Revoltas modernas exemplares. Algumas objeções comuns. O crescente domínio do espetáculo.
Capítulo 2:
Excitação preliminar
Descobertas pessoais.
Intervenções críticas. Teoria versus ideologia. Evitar falsas opções e
elucidar as verdadeiras. O estilo insurrecional. Cine radical. Opressão versus
jogo. O escândalo de Estrasburgo. A miséria da política eleitoral. Reformas e
instituições alternativas. Correção política, ou igualdade na alienação.
Inconvenientes do moralismo e o extremismo simplista. Vantagens da audácia.
Vantagens e limites da não violência.
Capítulo 3:
Momentos decisivos
Causas das diferenças
sociais. Convulsões de pós-guerra. Efervescência de situações radicais.
Autoorganização popular. O FSM. Os situacionistas en maio de 1968. O obrerismo
está obsoleto, mas a posição dos trabalhadores continua sendo o ponto central.
Greves selvagens e ocupações. Greves de consumo. O que podia ter acontecido em
maio de 1968. Métodos de confusão e cooptação. O terrorismo reforça o estado.
O momento decisivo. Internacionalismo.
Capítulo 4:
Renascimento
Os utópicos não prevêem
a diversidade pós-revolucionária. Descentralização e coordenação. Salvaguardas
contra os abusos. Consenso, dominio da maioria e hierarquias inevitáveis.
Eliminar as raízes da guerra e do crime. Abolição do dinheiro. Absurdo da
maior parte do trabalho presente. Transformar o trabalho em jogo. Objeções
tecnofóbicas. Temas ecológicos. O florescimento de comunidades livres.
Problemas mais interessantes.